por EDUARDO GALEANO (1940-2015)
O exército israelense, o mais moderno e sofisticado do mundo, sabe a quem mata. Não mata por engano. Mata por horror. As vítimas civis são chamadas de “danos colaterais”, segundo o dicionário de outras guerras imperiais. Em Gaza, de cada dez “danos colaterais”, três são crianças
Para justificar-se, o terrorismo de estado fabrica terroristas: semeia ódio e colhe pretextos. Tudo indica que esta carnificina de Gaza, que segundo seus autores quer acabar com os terroristas, acabará por multiplicá-los.
Desde 1948, os palestinos vivem condenados à humilhação perpétua. Não podem nem respirar sem permissão. Perderam sua pátria, suas terras, sua água, sua liberdade, seu tudo. Nem sequer têm direito a eleger seus governantes. Quando votam em quem não devem votar são castigados. Gaza está sendo castigada. Converteu-se em uma armadilha sem saída, desde que o Hamas ganhou limpamente as eleições em 2006. Algo parecido havia ocorrido em 1932, quando o Partido Comunista triunfou nas eleições de El Salvador. Banhados em sangue, os salvadorenhos expiaram sua má conduta e, desde então, viveram submetidos a ditaduras militares. A democracia é um luxo que nem todos merecem.
São filhos da impotência os foguetes caseiros que os militantes do Hamas, encurralados em Gaza, disparam com desajeitada pontaria sobre as terras que foram palestinas e que a ocupação israelense usurpou. E o desespero, à margem da loucura suicida, é a mãe das bravatas que negam o direito à existência de Israel, gritos sem nenhuma eficácia, enquanto a muito eficaz guerra de extermínio está negando, há muitos anos, o direito à existência da Palestina.
Já resta pouca Palestina. Passo a passo, Israel está apagando-a do mapa. Os colonos invadem, e atrás deles os soldados vão corrigindo a fronteira. As balas sacralizam a pilhagem, em legítima defesa.
Não há guerra agressiva que não diga ser guerra defensiva. Hitler invadiu a Polônia para evitar que a Polônia invadisse a Alemanha. Bush invadiu o Iraque para evitar que o Iraque invadisse o mundo. Em cada uma de suas guerras defensivas, Israel devorou outro pedaço da Palestina, e os almoços seguem. O apetite devorador se justifica pelos títulos de propriedade que a Bíblia outorgou, pelos dois mil anos de perseguição que o povo judeu sofreu, e pelo pânico que geram os palestinos à espreita.
Israel é o país que jamais cumpre as recomendações nem as resoluções das Nações Unidas, que nunca acata as sentenças dos tribunais internacionais, que burla as leis internacionais, e é também o único país que legalizou a tortura de prisioneiros.
Quem lhe deu o direito de negar todos os direitos? De onde vem a impunidade com que Israel está executando a matança de Gaza? O governo espanhol não conseguiu bombardear impunemente ao País Basco para acabar com o ETA, nem o governo britânico pôde arrasar a Irlanda para liquidar o IRA. Por acaso a tragédia do Holocausto implica uma apólice de eterna impunidade? Ou essa luz verde provém da potência manda chuva que tem em Israel o mais incondicional de seus vassalos?
O exército israelense, o mais moderno e sofisticado mundo, sabe a quem mata. Não mata por engano. Mata por horror. As vítimas civis são chamadas de “danos colaterais”, segundo o dicionário de outras guerras imperiais. Em Gaza, de cada dez “danos colaterais”, três são crianças. E somam aos milhares os mutilados, vítimas da tecnologia do esquartejamento humano, que a indústria militar está ensaiando com êxito nesta operação de limpeza étnica.
E como sempre, sempre o mesmo: em Gaza, cem a um. Para cada cem palestinos mortos, um israelense. Gente perigosa, adverte outro bombardeio, a cargo dos meios massivos de manipulação, que nos convidam a crer que uma vida israelense vale tanto quanto cem vidas palestinas. E esses meios também nos convidam a acreditar que são humanitárias as duzentas bombas atômicas de Israel, e que uma potência nuclear chamada Irã foi a que aniquilou Hiroshima e Nagasaki.
A chamada “comunidade internacional”, existe? É algo mais que um clube de mercadores, banqueiros e guerreiros? É algo mais que o nome artístico que os Estados Unidos adotam quando fazem teatro?
Diante da tragédia de Gaza, a hipocrisia mundial se ilumina uma vez mais. Como sempre, a indiferença, os discursos vazios, as declarações ocas, as declamações altissonantes, as posturas ambíguas, rendem tributo à sagrada impunidade.
Diante da tragédia de Gaza, os países árabes lavam as mãos. Como sempre. E como sempre, os países europeus esfregam as mãos. A velha Europa, tão capaz de beleza e de perversidade, derrama alguma outra lágrima, enquanto secretamente celebra esta jogada de mestre. Porque a caçada de judeus foi sempre um costume europeu, mas há meio século essa dívida histórica está sendo cobrada dos palestinos, que também são semitas e que nunca foram, nem são, antisemitas. Eles estão pagando, com sangue constante e sonoro, uma conta alheia.
Publicado em: 26/01/24
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
Muito bom o texto, parabéns!
Misericordia Deus e so o egoismo humano a falta da misericordia do amor meu Deus o ser humano e pior do que o diabo
A Palestina nunca existiu como um império nação ou estado : foi criado este nome , por Adriano, após a segunda diáspora judia , pelo fato dos romanos não mais aguentarem o problemático povo que ali então habitava: os judeus .
A Palestina era àquela época uma região da Síria.
Esta região nunca teve uma decisão que fosse ou “foi” baseada em bom senso, diplomacia ou
Boa vontade que é o comportamento dos homens “religiosos”, que seguem , ou devem (deveriam )seguir os preceitos divinos!!!
Parece que essa região é muito religiosa – nós sabemos – pela HISTÓRIA – o que as grandes religiões – melhor dizendo – os ditos homens religiosos fizeram ao longo dos anos!!!
Principalmente os muçulmanos – que o fazem até hoje.
Os cristãos no passado…
A terra está ocupada por Israel desde 1948.
Não!
A terra foi ocupada ao longo do tempo por inúmeros povos, inúmeras vezes: canaanitas, hebreus, judeus, romanos, judeus, muçulmanos, império otomano, império britânico, e desde 1948 – Israel .
Esta guerra reflete o grande conflito geopolítico subjacente entre o ocidente com seus conceitos, ideologia greco judaico cristã que são baseados na democracia, ciência, tolerância, evolução dos costumes e mudanças de comportamento que se adequam às novas descobertas “mais apropriadas”à nossa época e o oriente médio – ( não se pode incluir todo o oriente, porque China, Japão, Índia – que conhece muito bem os muçulmanos e que tem um conceito muito interessante e bonito (ahimsa)- cuja ideologia é baseada nos conceitos muçulmanos, criados por Maomé – que era um senhor da guerra ( war lord) que apregoava e se utilizou da espada para conseguir seguidores: conversão pela espada, morte ou escravidão.
Ou seja a famosa JIHAD islâmica.
A propósito, como Maomé morreu?
Os estudiosos devem saber…
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Josenei
Comentou em 27/01/24