O futuro foi cancelado. Ou pelo menos, como cantou Renato Russo em “Índios” parafraseando Paul Válery: “o futuro não é mais como era antigamente”. Houve um dia no passado em que o futuro foi o depositário dos nossos sonhos, o tempo em que projetávamos nossa utopia, o instigador-mor do Princípio Esperança (para lembrar de uma obra em 3 volumes escrita por Ernst Bloch e publicada no Brasil pela Contraponto). Porém, hoje o porvir ameaça com tsunamis e vírus mutantes, o futuro assusta e angustia muito mais do que acaricia ou promete flores.
Diante do superaquecimento climático e das infecções virais de magnitude planetária, ganham atualidade renovada obras como a de Banksy – em que o “siga seus sonhos” acaba sofrendo a intervenção de um “CANCELLED” (foto que abre este post), grafite no qual há um pouco do eco das melancólicas cantorias de John Lennon, no hino ateu “God”, que anunciavam o descenso do utopismo hippie: the dream is over. O Sonho acabou e Deus não passa de “um conceito através do qual medimos nossa dor…”
Os exemplos poderiam ser multiplicados: do diálogo de Mafalda com o caranguejo, na obra de Quino, à atual proeminência do enredo de Snowpiercer – O Expresso do Amanhã (filme do sul-coreano Bong Joon-Ho que transformou-se num arrasa-quarteirão da Netflix), o clima cultural ou zeitgeist aponta para esta desconfiança no futuro.
O sci-fi distópico expressa à maravilha este zeitgeist através de obras primas como Children Of Men (de Alfonso Cuáron, baseado em livro de P.D. James), onde o colapso da fertilidade humana e a proliferação de autoritarismos totalitários e hightech tornam sombrio e bleak o mundo humano que tenta se defender da extinção… Estas representações do futuro e suas ressonâncias psíquicas não são elas mesmas as causas mas sim os efeitos de uma realidade concreta e objetiva onde o capitalismo se mostra não só uma máquina mortífera (nas mãos de Bolsonazis, explicitamente genocida!), mas também como produtor em massa de epidemias de sofrimento e adoecimento psíquico-afetivo. Um $istema que coloca o sujeito em ansiedade perpétua, quando não o lança ao pânico ou ao suicídio – “será que o futuro é tão ruim que ele está voltando?”, reflete Mafaldita.
Escrevo, neste início de Fevereiro de 2021, tendo no “futuro coletivo” a imagem de um Carnaval que certamente será atípico. E que também seria melhor se nem fosse… A sinistra ameaça com que Gonzaguinha (revivido por Elza Soares no Planeta Fome) brincava, falando ao destinatário de “Comportamento Geral”: “Seu Zé, e se acabarem com seu Carnaval?” – agora se realiza: no Brasil de Fevereiro de 2021, com 300.000 cidadãos transformados em cadáveres pela política irresponsável, negligente e concretamente genocida de Bolsonaro e sua seita, não vai ter Carnaval “normal” p%&* nenhuma! O “ideal” – a que ele se reduziu! – seria que carnavalizássemos através de uma infinitude de Bondes do Isolamento e Blocos do Eu Sozinho… Escolas de samba reunidas pelo Google Meet, cada um sambando no seu quadrado, dentro do próprio dormitório…
Festa triste num país adoecido, e tornado ainda mais doente pelo fascismo social que se esparrama por aí, pelas bolhas do Zapistão e nos antros de doutrinação que são igrejas, templos e casas da Família Tradicional Brasileira que assista à Mídia Hegemônica Nacional…
E muitos de nós vamos entrando para as estatísticas dos adoecidos psíquicos justamente pois colapsa para nós a chance de caminhar na direção do futuro com algum senso de confiança, de propósito, de abertura a algo que pode ser bom. O futuro-melhor parece ter sido cancelado e os necrocapitalistas só colocaram no lugar a ameaça do pesadelo totalitário – o interesse privado de muitos poucos sendo colocados acima dos interesses da maioria da humanidade, enquanto nossa irreflexão e nossa imaginação utópica carcomidas pelo conformismo tornam emblemático da época o dito: “é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo…”
É justamente nesta deterioração do futuro que Mark Fisher, inspirando-se em Franco Berardi, vê a chave para compreender a profusão de adoecimento psíquico que se dissemina na esteira do terrível mote capitalista-neoliberal – não há alternativa. A História acabou, como pregou Fukuyama, contente-se, se possível, com o capitalismo tal como ele se constituiu com Pinochet, Tatcher e Reagan – todas as alternativas a ele eram ilusórias ou colapsaram. Fato? Ou ideologia?
Numa sociedade fraturada e doente, com a infecção viral disseminada a partir de deliberada campanha de desinformação de tamanho federal, o futuro tornou-se pior que apenas incógnita ou mistério: o futuro tornou-se pesadelo. E nossas mentes padecem sobre o peso deste pesadelo distópico patrocinado e praticado por aqueles que parecem querer transformar isto aqui numa imensa Devastolândia…
O sofrimento psíquico foi agravado pela conjuntura da infecção viral – alerta a Organização Mundial da Saúde: “O isolamento, o medo, a incerteza, o caos econômico – todos eles causam ou podem causar sofrimento psicológico”, disse Devora Kestel, diretora do departamento de saúde mental da OMS. [Fonte: G1]
Diante deste grave cenário, em que a OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde) alerta sobre o incremento de “gatilhos” para o suicídio nesta conjuntura pandêmica, é preciso aprender, e quanto mais rápido melhor, que o psíquico é político. Que ninguém é um “caso de saúde mental” por mérito ou culpa próprios, isto não é um problema pessoal mas uma encrenca coletiva.
Desta enrascada só sairemos com terapia coletiva, que inclui necessariamente a cura que concerne à memória – nós adoecemos, como sociedade, por desmemória, por termos feito tão pouco e tão mal uma espécie de Comissão Nacional da Verdade transformada em movimento cívico… Verdade, transparência, direito à memória, entre nossas bandeiras e estandartes: nisso falhamos (por enquanto!), ou melhor, ficou sendo tarefa para nosso porvir – e comecemos já!
Para além da divisão das seitas, da discordância política altamente divisória que tem nos fragmentado, conseguimos concordar, brasileiros, que o Sofrimento Interno Bruto só tem aumentado? E que 250.000 pessoas, nossos concidadãos, perderam a vida neste tsunami da morte? Mas hoje quero falar também do tsunami da Vida – e da implausível mas possível emergência de um ecosocialismo biofílico.
Nosso povo tem sofrido pra caramba nos anos desgovernados pela Bolsocracia: eis uma hipótese que podemos ter consenso em concordar? A dor geral não foi incrementada? As pessoas passaram a sofrer mais do que antes, na crise pandêmica que ora atravessamos (2019 a 2021)?
Perguntar pelo montante de sofrimento psíquico pode parecer uma tarefa irrisória a que se propõe o filósofo entediado em seu tempo de folga entre aulas. Mas expor a tarefa de pensar sobre o sofrimento coletivo é mais do que necessário caso queiramos qualquer tipo de terapia coletiva – em contraposição à privatização das terapias que vemos proliferando. Compre sua terapia no Mercado das Muletas Psíquicas! Te ofertaremos, em parcelas (“Débito ou Crédito, senhorita?”, pergunta uma voz robótica ao consumidor meio-zumbi, a oportunidade de ser são: São Consumidor, compre a cura para a Depressão que o próprio compra-compra causou!
Estamos falando de sofrimento psíquico, da hipótese de que sua quantia tenha tido um ascenso, um papo que parece não levar a nada senão a um fluxo agridoce de uma um pouco aporrinhante “melancolia de esquerda”, como explora o filósofo Enzo Traverso em seu livro… Esquerdista e melancólico: esta a união que deu fio à jornada, à travessia, de um Walter Benjamin – à luz de seu suicídio, como poderíamos ignorar que o psíquico é político? Que a melancolia tem causas sociais?
E que Benjamin morto por suas próprias mãos não deixa de ser um crime atroz dos nazifascistas…
Tudo isso pode ofender à mente positivista, que quer tratar apenas do que é quantificável, matematizável, e expele com horror, pra longe de si, o inquantificável peso de todas as depressões, de todas as psicoses, de todos as esquizofrenias, de todas as nóias – quem busca contabilizar isto, perde-se no infinito…
Considerem agora a hipótese de que tudo que é psíquico é político. Este fato de que a saúde mental não é um problema meramente individual se escancara nesta Pandemia de Covid19: milhões de pessoas que nunca se infectaram nem se infectarão com o coronavírus adoeceram de fato, de uma miríade de “condições” que por inércia chamemos de “psicopatológicas” – por conta do impacto psíquico do confinamento e das medidas quarentenárias a que buscaram aderir.
Evidenciou-se, socialmente, sobretudo no Brasil sob a batuta enlouquecida dos “profissionais da violência”, uma desgovernança trágica. Que aliás está em pleno desenrolar de sua fúria homicida enquanto traço estas mal traçadas. O Bolsonarismo é o capitalismo neoliberal in extremis entrando em estado de necrose. Querendo pôr a Doutrina do Choque Pinochetista de novo em cena – tanques e bancos em prol de um neo-colonialismo servil ao Tio Sam (ou melhor, à sua fração Trumpista…).
Que isto é um pesadelo idiota, e não um projeto de país, é claro e evidente a qualquer cidadão que exercite os miolos em prol do senso crítico e enfrente mentalmente a tarefa de julgar as ações de nosso governo. Sendo fiéis à máxima de La Boétie – “sejamos resolutos em ser insubmissos!” Pois decerto a última coisa que eles merecem é nossa submissão, e fizeram por merecer nossa revolta.
O falecido filósofo e escritor Mark Fisher tem visões interessantes sobre a insubmissão: ele clama pela “conversão do descontetamento privatizado em raiva politizada” (p. 141), contra a “submissão fatalista” às políticas econômicas de “austeridade”, apontando que é preciso “reinventar a solidariedade” e afrontar a “privatização do estresse” (p. 153).
Atacando as falácias da meritocracia, Fisher fala aos deprimidos do mundo a partir do lugar-de-fala de quem lutou a vida inteira contra esta condição (a que finalmente sucumbiu): não acreditem na lorota de que a depressão é um problema pessoal, que você como indivíduo veio com “defeito de fabricação” – pois a depressão é evidentemente um problema sócio-político. Porém, Fisher sabe que “os indivíduos culparão a si mesmos antes de culparem as estruturas sociais” – é que a ideologia convida-nos à “convicção subjacente” de que “somos todos exclusivamente responsáveis pela nossa própria miséria e portanto a merecemos.” (p. 140)
Na verdade, precisaríamos que os deprimidos se convertessem em revoltados, numa conversão Camusiana do absurdo à solidariedade? Que cessarem de culpar-se por estarem infelizes, para perceberem a raiz e a causa de seus males fora deles?
Um dos mais importantes ensinamentos de Mark Fisher, talvez, seja a noção de que nem a “doença mental” (o que prefiro chamar de adoecimento psíquico) nem o clima atmosférico podem hoje ser considerados “naturais”. Devemos considerar Brechtianamente que “nada deve parecer impossível de mudar”.
Saúde mental: campo em que a relação ou vínculo inextricável entre indivíduo e coletividade se manifesta (em uma miríade de formas, desafiando nossa compreensão e nossa ação). O que chamamos de enfermidades psicológicas, afirma Fisher, tem origem social, como é evidente, mas a ideologia hegemônica e sua ‘ontologia’ recalca e esconde:
“Em vez de atribuir aos indivíduos a responsabilidade de lidar com seus problemas psicológicos, aceitando a ampla privatização do estresse que aconteceu nos últimos 30 anos, precisamos perguntar: quando se tornou aceitável que uma quantidade tão grande de pessoas, e uma quantidade especialmente grande de jovens, estejam doentes? A ‘epidemia de doença mental’ nas sociedades capitalistas deveria sugerir que, ao invés de ser o único sistema que funciona, o capitalismo é inerentemente disfuncional, e o custo para que ele pareça funcionar é demasiado alto.” (FISHER, Autonomia Literária, 2020, p. 37)
Ou seja, como escrevem Victor Marques e Rodrigo Gonsalves no posfácio , “na medida em que antigas formas de solidariedade institucional e amparo comunitário são desfeitas, o resultado é a privatização do sofrimento e a individualização da angústia” (p. 185). O Bolsonarismo é uma das piores expressões desta doença: propõe o Estado Mínimo neoliberal à maneira Pinochetista, ou seja, com um Estado Máximo em sua expressão penal-policial – “liberal na economia, mas autoritário conservador nos costumes”, lançando mais lenha na fogueira do “cada um por si” e explicitando, sobretudo nas atitudes do Ogro-em-Chefe Jair Bostossauro, um desprezo pela vida humana típico de um psicopata capaz de dizer “e daí?” para dezenas de milhares de mortes evitáveis, num delírio nefasto de irresponsabilidade e negacionismo.
O Bolsonarismo é uma espécie de zumbi, uma encarnação do capetalismo neoliberal que leva o colapso da ética tão fundo que parece colocar todo o sistema político em estado de necrose. Devemos, em prol da saúde cívica e do vigor intrínseco das democracias autopoéticas que coletivamente construímos, fomentar a atividade de reimaginar o futuro e as práticas para construi-lo enquanto futuro radicalmente outro – fora da esfera necrocapitalista que o Bolsonarismo tão mal expressa.
É que o Bolsonarismo produz uma espécie de zumbilândia repleta de milícias de mortos-vivos, incapazes de reflexão, com os dedos no gatilho e muitos dogmas a vomitar por dentro das bolhas sectárias. Uma criatura bestial chefiada por um monstro moral que cultiva a idolatria a estrupícios morais e anões éticos como Ustra ou PInochet (em linguajar jurídico, são criminosos-contra-a-humanidade), o Bolsonarismo representa uma elite que quer gozar de pleno senso de irresponsabilização geral e irrestrita… É o prepotente Chefão Macho que quer rir e gozar enquanto o povo passa fome aos milhões e morre à míngua, desassistido em meio ao desmantelamento da “rede de proteção social” – isto que economistas neoliberais desprezam com o nome de Nannystate, o Estado Babá.
Ora, o que se revelará neste artigo são vislumbres da crise psíquica global que vem na esteira da pandemia, numa perspectiva que enxerga como inextricáveis os elementos individuais e coletivos – por exemplo, o modo como lidamos com a noção de lockdown, muitos de nós que somos anti-autoritários, de diálogo franco e aberto com os anarquistas, julgamos que é preciso por emergência sanitária a imposição de medidas restritivas para contenção da pandemia. O paradoxo do governo Bolsonaro é que ele não escolheu a via do autoritarismo sanitário, exatamente, mas sim pela política de mandar a cambada trabalhar pra não parar a “Roda da Economia”!
O que adoece tanta gente, nesta conjuntura, é a vivência nova, traumática, de um Estado que não é Babá, mas sim uma fera bestial que mordisca um churrasquinho e bebe uma cerveja enquanto sobe sobre uma pilha de crânios humanos dizendo “e daí? eu não sou coveiro…” e etc. Como multidões não adoeceriam diante de uma tão flagrante presença pesada daquilo que pensávamos já aposentado da História, já varridos para fora do palco histórico pela tsunami lulopetista! O gorila da Ditadura re-desperta em 2018, frauda uma eleição voando na cyberasas da Mentira Viralizada, e acaba se revelando o pior governo entre 98 nações analisadas pelo Löwy Institute da Austrália…
O #FiqueEmCasa, registre-se para a História, foi uma mobilização cidadã com muito mais afinidade à maré cívica do #Ele Não (2018) e do #TsunamiDaEducação. As pessoas que se mobilizaram para interromper atividades institucionais – como no IFG, onde interrompemos atividades docentes e discentes em Março de 2020, condição que perdura há 11 meses… – estavam sendo responsáveis. Estavam imaginando o futuro com a devida lente de uma clarividência científica, de uma mente treinada nos procedimentos da ciência. Mas não fomos capazes de gerar nenhuma mobilização de massa que pudesse fazer frente à máquina comunicacional do governo Bolsonaro e sua impressionante maquinaria de conquista de “súditos” que ainda lhe tratam à maneira idólatra, “mito!”
Enquanto escrevo estas linhas, a Holanda queima com riots da galera que protesta contra o lockdown, os enfurecidos com as medidas restritivas da liberdade e ir-e-vir, e talvez até possamos achar analogias com atitudes mais Black Blockers aí – mas se trata de um Black Blockismo capturado pela Direita, que ofende gratuitamente os profissionais da ciência, os trabalhadores da saúde, os que estão na linha de frente do combate à pandemia…
Nosso sofrimento psíquico – se ouso falar em “nosso” nome, é justamente por me sentir incluído entre aqueles que tiveram seus tormentos psíquicos incrementados pelo contexto pandêmico e que está fazendo esforços para encontrar respostas robustas e soluções coletivas pra este caos onde se delineia a nova edição da BANALIDADE DO MAL…
Não quero enveredar por comparações entre Seu Jair e Adolf Eichmann – meu foco aqui é na elucidação do que venho chamando de negacionismo em cascata, de efeitos práticos catastróficos: Bolsonaro, uma pessoa isolada, não seria tão nefasto caso não encontrasse legiões de cúmplices: propagadores de suas mentiras, papagueadores de sua doutrinas, negacionistas práticos e teocráticos tripudiando sobre os cientistas, servindo obedientes e submissos às mãos do títere populista, em seu delírio de fama e poder, o Excrementíssimo, inaugurando tendência enquanto genocida ostentação – ostentando irresponsabilidade, despreocupação e urros machões contra os “maricas” que usam máscaras… O Ogro-Em-Chefe e seus Gorilas poderia ser uma boa banda pra eles formarem…
Como se surpreender que tal situação sócio-política seja tão tamanhamente INSANIZANTE?… Já que não há fim em vista pra essa insânia social ultra-disseminada, a depressão de instaura e propaga na sombra que faz a pesada montanha do NÃO HÁ ALTERNATIVA.
Voltem, seus hippíes de merda, pra tumba de Woodstock! Agora aqui é neoliberalismo-com-tanques, e quem discordar a gente manda, com um cabo e um soldado, pro pau-de-arara e pra “ponta da praia”! Que isso tenha podido triunfar, ainda que de maneira provisória (mas quanto tempo ainda durará?), já é um indício de que a sociedade brasileira já estava doente antes da ascensão de Bolsonaro. O presifake psicopata só aproveitou uma onda forte de psicose de massas que foi insuflada por Grande Mídia e pelo Judiciário espetacularizado de Moros, Dallagnols e Cia Lava Jatística – o antipetismo foi uma feroz campanha destinada a destruir reputações, nada comprometida com respeito a verdades factuais, repleta de lawfare em sua ânsia condenatória sintetizada às maravilhas pelo Power Point dos que “não tem provas, só convicções”…
Talvez estejamos vendo, durante a pandemia, o potencial de insanizante de massas que possui o eclipe de um futuro melhor… O necrocapitalismo Bolsoeugênico ora em atuação na República das Milicias chefiadas pela famiglia Bolsonaro é a encarnação da distopia. Talvez nenhum ficcionista de sci-fi brasileiro tenha escrito algo que prenunciasse isto que estamos vivendo – o Brasil real é mais surreal do que a nossa capacidade de processá-lo e expressá-lo em obras de ficção… Este ‘eclipse do futuro’ tem a ver com o peso desta ideologia, Tatcheriana, do NÃO HÁ ALTERNATIVA.
Se o sujeito sentisse que alternativa há, que o “futuro não tá escrito” (Joe Strummer), se tivesse esta utopia compartilhada, e se fosse assim ansiando, cotidianamente construindo na companhia de concidadãos e amigos, a construção deste “ideal” no “real”. Sempre ciente da pouca força que há na pessoa solitária, e na força tremenda que há coletivo (massa pode ser poder) – convivas na forja concreta e criativa de sociedades melhores e convívios mais sábios…
Esta utopia é que parece ter um pouco colapsado entre nós, ter sumido da cultura mainstream para o consumo de massas, e a vacina, ainda que seja massificada, não traz resolução, mas insere uma nova complexidade neste labirinto. E os negacionistas da vacina? Os que deliberadamente irão sabotar as campanhas? Os que podem até mesmo vir a atacar estoques e refrigeradores de insumos?
O que quero dizer é que o sofrimento psíquico tende a montante, mesmo com a vacinação, pois a esperança de imunização pode levar a certo alívio psíquico, porém há o prosseguimento da angustiosa apreensão de um porvir que se afigura ameaçador. Assim ensina a experiência: põe a dor no caminho para que a gente aprenda, e de preferência para que tenhamos a sabedoria de, abelha forjando o mel a partir do néctar das flores, fazermos florescer nossa própria justa colméia!
Outro elemento do adoecimento tem a ver com o “pessimismo”, uma condição psíquica em que somos dominados por afetos tristes provindos da imaginação de possibilidades terríveis que o mundo real e atual parece delinear como plausíveis. Faço aqui, talvez por interesse próprio, uma defesa do pessimismo, que pode ser perfeitamente legítimo, acredito, caso a lúcida mente do sujeito tenha concluído que as coisas vão mal e podem vir a se tornar ainda piores… Que o pior esteja no espectro do possível é uma tese ontológica que me parece bastante válida e implica em sua esteira consequências éticas e estéticas tremendas.
Quero dar um exemplo: um sujeito, altamente noiado, fica pensando no número “19” que acompanha o nome da doença, repete mentalmente “covid dezenove”… a peste nascida em 2019! – até que desperte para o fato de que pode haver uma covid45, uma covid89, ou seja, que o futuro está grávido de catástrofes. O boletim climático adiciona outras faíscas para este caldeirão que ameaça se tornar ansiedade perpétua – e ouso afirmar que muitos pessimistas sofrem esta condição.
Mark Fisher ensina: não acreditem que esta ansiedade é “natural”, pois é socialmente produzida; não se culpem pessoalmente por senti-la, pois através delas se manifesta o condicionamento social ao qual somos convocados a, num levante, trazer abaixo para reconstrui-lo em outras bases. A depressão é a condição médica mais atendida pelo aparato de Saúde Público do Reino Unido, afirma Fisher, ou seja, no “SUS” de lá, no Sistema Único de Saúde inglês, a depressão já se tornou uma espécie de condição massificada. O necroliberalismo está fabricando depressão em massa e está gozando com os lucros estratosféricos que faz vendendo remédios, enquanto gasta outros bilhões no militarismo brucutu e acéfalo que suporta o aparato policial-carcerária calcado na Lei proibicionista. Fume um baseado diante da viatura, vá parar no Carandiru (talvez o Estado até te conceda, grátis, a chance de ser chacinado!) – porém, tome Rivotrils e antidepressivos de Pfeizers e Bayers, tá beleza, Troféu Joínha!
Não quero aqui também fazer defesa, como se este texto fosse um palanque e vocês a assembléia de uma cybercongregação, diferida no espaço-tempo, mas capaz de soltar imprevistas faíscas, não quero defender o otimismo barato, nem pregar que a crença em happy end seja terapêutica – e que se danem os que querem consumir smiley faces e emoticons em cascata como se fosse o marshmallow digital da salvação afetiva universal… Não tô nessa pelos coraçõezinhos de Instagram, apenas de sentir também o inédito de nossa condição geracional: as redes sociais são termômetros de nossa “popularidade”, de certo modo são mecanismos de aferição de poder.
Quantos você consegue afetar em sua “bolha social digital”? Um senso de impotência acompanha milhões e milhões dos usuários fissurados nos gadgets e apps vomitados pelo mundo afora a partir da indústria Big Tech do Vale do Silício… A Internet está repleta de informação sobre as mudanças climáticas ou a sexta extinção da biodiversidade planetária, mas a cacofonia das bolhas impede a maioria de ouvir… de compreender esta mensagem… Em massa, deprimidos, semi-zumbis do necrocapitalismo que fracassa mas não morre, nos enfurnamos na Caverna dos Dogmas e o resultado aí está…
Uma catástrofe humanitária, no Brasil, sob Bolsonaro, não está sendo impedida por forças cidadãs durante o período pandêmico – movimentos sociais atados, organismos internacionais em polvorosa diante das violações de Direitos Humanos, denúncias sendo acolhidas pelo TPI e de Haia, e os espectros ainda tímidos de restauração de um Estado Democrático de Direito neste país tão golpeado – e hoje desgovernado por um partícipe e beneficiário do Golpe parlamentar de 2016 que depôs Dilma Rousseff.
Em síntese, a época coloca a tarefa que urge: reinventar nossa capacidade de conceber um futuro pós-capitalista, uma alternativa à civilização monstruosa que agoniza sem que a nova possa ainda nascer, e seremos tão mais “sadios” em nosso psíquico quanto mais percebermos que não há soluções individuais para problemas coletivos, que Prozac não é panacéia, que Rivotril não é redenção, que o problema não está na bioquímica cerebral ou na falta de serotonina ou num pequeno “erro genético” – como ensina Fisher, “a bioquimicalização dos distúrbios mentais é estritamente proporcional à sua despolitização.” (p. 67)
“Considerar as enfermidades psicológicas como um problema químico e biológico individual é uma vantagem enorme para o capitalismo. Primeiramente, isso reforça a característica do próprio sistema em direcionar seus impulsos a uma individualização exacerbada (se você não está bem, é por conta das reações químicas do seu cérebro). Em segundo lugar, cria um mercado enormemente lucrativo para multinacionais farmacêuticas desovarem seus produtos (podemos te curar com nossos inibidores seletivos de recaptação de setononina). É óbvio que toda doença mental tem uma instância neurológica, mas isso não diz nada sobre a sua causa. Se é verdade que a depressão é constituída por baixos níveis de serotonina, o que ainda resta a ser explicado são as razões pelas quais indivíduos em específico apresentam tais níveis, o que requereria uma explicação político-social. A tarefa de repolitizar a saúde mental é urgente se a esquerda deseja desafiar o capitalismo realista.” (p. 67)
Repolitizemos nossa angústia! Sejamos solidários no tormento! Reabramos à força as alternativas que nos estão sendo negadas! Façamos juntos um futuro onde seremos resolutos em ser insubmissos e em construir nosso próprio coletivo auto-governo, bem longe da tirania insanizante de genocidas irresponsáveis e desumanizantes como o Coiso e seu séquito de fanáticos virulentos. Não há cura psíquica sem ação revolucionária, nem outro mundo possível para a Mente sem uma outra realidade que devenha “lá fora” – onde cada um de nós está enraizado, em teia de interdependência incontornável, “fios na teia da vida”, e o que quer que façamos à teia será feito a nós mesmos.
Eduardo Carli de Moraes
Fevereiro de 2021
A Casa de Vidro
Goiânia, Brasil
D-Generation are highly influenced by ’60s mod and freakbeat. This Manchester trio took their name from The Eyes’ “My Degeneration”, a parody of The Who’s anthem. D-Generation love the psychedelic/psychotic intensity of freakbeat bands like The Eyes, John’s Children, The Creation, but they don’t want to recreate it. Psychedelia means abusing technology, they argue, and today that means fucking with samplers and sequencers, not guitars.
Unlike These Animal Men and Blur, D-Generation haven’t forgotten that mod was short for modernist. The original mods wanted to fast-forward into the future, not replay lost golden ages. So D-Generation’s “psychedelic futurism” draws on ambient and jungle–music that’s absolutely NOW, absolutely BRITISH. And instead of the usual iconography of swinging London or English whimsy, D-Generation pledge allegiance to a “dark, deviant tradition” of Englishness that includes The Fall, Syd Barrett, Wyndham Lewis, Powell/Pressburger and Michael Moorcock.
D-Generation’s atmospheric dance is like a twilight-zone Ultramarine–lots of English imagery, but instead of bucolic bliss, the vibe is urban decay, dread and disassociation. On their EP “Entropy In the UK”, “73/93” rails against the “Nostalgia Conspiracy”, using Dr Who samples of “no future”. D-Generation call their music “techno haunted by the ghost of punk” and on ‘The Condition Of Muzak’ that’s literally the case, as it samples Johnny Rotten’s infamous taunt: ‘ever get the feeling you’ve been cheated?”. Originally, the target was rave culture itself, but this has widened out, says band ideologue Simon Biddell, “to implicate the entire culture of cynical irony.” Then there’s “Rotting Hill”, a stab at “a ‘Ghost Town’ for the ’90s”; Elgar’s patriotic triumphalism is offset by samples from the movie Lucky Jim–“Merrie England? England was never merry!”.
D-Generation, says Biddell, are dismayed by the way “young people are content to embrace a rock canon handed down to them, and seem unable to embrace the present, let alone posit a future.” But they’re optimistic about the emergence of “a counter-scene, bands like Disco Inferno, Bark Psychosis, Pram, Insides, who are using ambient and techno ideas but saying something about the ‘real world’, not withdrawing from it”.
Add D-Generation to the list of this nation’s saving graces.
Publicado em: 03/02/21
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
Muito acertivo, che! Revolução anti-capitalista como forma de reconstrução política, reparação pscíquica e emergência ecológica. Avante! #ForaGenocida #Impeachmentjá
A Casa de Vidro Ponto de Cultura e Centro de Mídia
Renato Costa
Comentou em 05/02/21