L’Ennemi
Ma jeunesse ne fut qu’un ténébreux orage,
Traversé çà et là par de brillants soleils;
Le tonnerre et la pluie ont fait un tel ravage,
Qu’il reste en mon jardin bien peu de fruits vermeils.
Voilà que j’ai touché l’automne des idées,
Et qu’il faut employer la pelle et les râteaux
Pour rassembler à neuf les terres inondées,
Où l’eau creuse des trous grands comme des tombeaux.
Et qui sait si les fleurs nouvelles que je rêve
Trouveront dans ce sol lavé comme une grève
Le mystique aliment qui ferait leur vigueur?
— Ô douleur! ô douleur! Le Temps mange la vie,
Et l’obscur Ennemi qui nous ronge le coeur
Du sang que nous perdons croît et se fortifie!
— Charles Baudelaire
The Enemy
My youth has been nothing but a tenebrous storm,
Pierced now and then by rays of brilliant sunshine;
Thunder and rain have wrought so much havoc
That very few ripe fruits remain in my garden.
I have already reached the autumn of the mind,
And I must set to work with the spade and the rake
To gather back the inundated soil
In which the rain digs holes as big as graves.
And who knows whether the new flowers I dream of
Will find in this earth washed bare like the strand,
The mystic aliment that would give them vigor?
Alas! Alas! Time eats away our lives,
And the hidden Enemy who gnaws at our hearts
Grows by drawing strength from the blood we lose!
— William Aggeler, The Flowers of Evil (Fresno, CA: Academy Library Guild, 1954)
O INIMIGO
A juventude não foi mais que um temporal,
Aqui e ali por sóis ardentes trespassado;
As chuvas e os trovões causaram dano tal
Que em meu pomar não resta um fruto sazonado.
Eis que alcancei o outono de meu pensamento,
E agora o ancinho e a pá se fazem necessários
Para outra vez compor o solo lamacento,
Onde profundas covas se abrem como ossários
E quem sabe se as flores que meu sonho ensaia
Hão de achar nessa gleba aguada como praia
O místico alimento que as fará vigorosas?
Ó dor! Ó dor! O tempo faz da vida uma carniça,
E o sombrio Inimigo que nos rói as rosas
No sangue que perdemos se enraíza e viça!
Publicado em: 04/01/11
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
Citei este belíssimo poema de Charles Baudelaire em minha tese de mestrado em História Contemporânea “Estaline nos manuais de Portugal e Brasil”, aprovada pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (2019) e que será publicada em forma de livro no Brasil em novembro de 2023 com o título “Stalin nos manuais de Brasil e Portugal”.
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Paulo Oisiovici
Comentou em 06/10/23