Brasília, 24 a 28 de Abril,
Acampamento Terra Livre
A seguir, palavras de Helena Palmquist
“Os patrões e o estado, e a academia e a mídia que lhes servem, seguem nos acusando de sermos anacrônicos na reivindicação de direitos humanos, animais, florestais, ancestrais, básicos.
É anacrônico defender um rio, é ultrapassado lutar pela mata, não é racional brigar por territórios, chega desse negócio de índio, ribeirinho, quilombola, camponês, seringueiro, pescador, lavrador, colono, chega desses povos do mato, do rio e da terra, que atrapalham a nossa razão irrefutável.
Eles nos chamam de minorias com projetos ideológicos irreais.
Cantam e decantam, insuportavelmente afinados, em centenas de minutos de televisão pagos a peso de ouro, a cantilena de que qualquer legislação que nos proteja contra eles é ultrapassada, de que é preciso “modernizar”.
Eles falam da CLT, que é fruto de muita luta dos trabalhadores nossos avós; e da Previdência, que igualmente resultou da luta de nossos avós. São leis velhas, eles dizem em horário nobre e em infinitas publicidades patrocinadas em redes sociais.
Eles falam das leis ambientais e indígenas. E da Constituição brasileira. Estão ultrapassadas, dizem. Querem nos convencer que a modernidade reside na desproteção jurídica total do bem comum.
Querem nos convencer que o mesmo Agro que chacinou camponeses em Colniza há 5 dias, é Tech.
É moderno.
Querem nos convencer que é moderno o mesmo Agro que assassinou Dorothy em Anapu e Chico Mendes em Xapuri, Zé Carlos e Maria em Nova Ipixuna, Doutor e Fusquinha em Marabá, Dema em Altamira, Oziel e outros 18 em Eldorado dos Carajás e Quintino em Viseu.
Pela lógica dos patrões que nos governam, qualquer proteção ao bem comum e público representa uma ameaça ao lucro. E o nome do Brasil, na onomástica deles, é lucro.
O nome Brasil, uma árvore que, ao ser quase extinta, enriqueceu Portugal ao ponto de ser um dos impérios mais capitalizados do planeta. O nome que nos deram é como uma maldição. Um estado-nação que extingue o que tem para enriquecer outrem. Até quando?
Quando os portugueses, os patrões e o estado aqui aportaram, esse território hoje denominado Brasil continha em seus domínios as duas maiores florestas tropicais do planeta todo: a mata atlântica e floresta amazônica.
Em pouquíssimo tempo (em termos geológicos) após a chegada dos elegantes europeus, 90% da mata atlântica foi dizimada, junto com todas as cosmologias, entendimentos, tessituras e histórias que não temos mais como resgatar e que certamente participaram do processo que a formou. O que perdemos é irrecuperável? Acho que não. Tenho observado que a resistência, nesse território de tantos territórios, reside muito em manter modos de vida, em manter músicas, ritos, tambores, plantios, comidas, ditos, sotaques, objetos, jeitos, espécies, histórias.
Mas a persistência não é nossa, nós resistimos porque os patrões de sempre persistem em nos anular, expulsar, escravizar e se nada mais nos calar, matar à bala.
São eles que não entendem que o tempo deles já passou. Eles que persistem na desgraça, apaixonados pelo que produziram. Eles explicam que direitos devem ser eliminados para que o povo brasileiro seja objeto de caridade e salvação com fins corruptos e eleitoreiros. O hábito deforma não só a boca, mas principalmente a prática política.
Quanto menos direitos, mais empregos, eles dizem. Como disseram, não muito tempo atrás, na lei sancionada por Dilma Rousseff, que anistiar desmatadores diminuiria o desmatamento.
São mentiras fartamente demonstradas em exemplos vindos de todos os continentes do mundo. Mas ditas com candura por representantes de todas as colorações do espectro eleitoral brasileiro. Assim, na cara dura, o tempo todo.
A mentira, a mais óbvia mentira, é mesmo a base da política ocidental como profetizou Goebbels (quase escrevi Gleise)?
Nos impingem essa visão diariamente no Jornal Nacional e todo sábado nos programas do Luciano Huck, seja qual for o partido no poder. Progresso é a senha, à direita e à esquerda.
Progresso e propina, devia constar na bandeira nacional, se sinceridade e candura combinassem com esse país.
Não existe nada mais velho do que a modernidade, nada mais fracassado que o modelo dito moderno de exploração do trabalho e da natureza.
Essa modernidade mofada que agride índios, negros e pobres e confina-os à invisibilidade e à inexistência JÁ ERA e pertence a ERAS PASSADAS.
Não existe nada mais triste e ultrapassável do que a proposta dos patrões do mundo e é um sinal de sintonia cosmológica que, na mesma semana em que os povos indígenas estão em Brasília, símbolo máximo da corrupção patronal brasileira, reinvindicando seu direito a existência, os trabalhadores brasileiros estão intensamente mobilizados para impedir a retirada brutal de direitos duramente conquistados, por essa mesma meca da corrupção, da extinção e do genocídio que é Brasília.
Fascista é a Fiesp, ultrapassada é a Globo, velha é a ideia que sustenta Brasília longe do Brasil, triste é essa modernidade já morta que nos quer iguais no sub-emprego terceirizado e super-explorado, pagando fortunas por energia retirada de rios caudalosos dos quais não podemos mais beber e nos quais não temos mais como navegar, pescar, muito menos nadar.
Avante! Para quem não lucra com a desgraça significa que chega de exploração extrema de recursos nada naturais e que é chegada a hora de aprender com os povos autônomos e autossuficentes que habitam os beiradões e interflúvios da Amazônia.
Na Amazônia está a chuva, a floresta e o futuro. Nenhuma modernidade arcaica importada vai superar o que a Amazônia sempre deu de presente para os Brasis. Amazônia plantada e gestionada pelos povos indígenas por milênios. Amazônia inteira dos povos que se conectam com a mata e que sabem mantê-la, os nativos e os chegados.
Amazônias mil, todas empenhadas em envolver vários mundos de vivos e mortos, de animais humanos ou quase, de peludos e pelados, de plurifloras e de polifaunas, de reservados e de expostos, de espíritos e pessoas, de rexistentes e de dexistentes, de caçadores, coletores, agricultores, pescadores, construtores, arquitetos, xamãs, poetas, cantadores, filósofos, sonhadores. Contra o des-envolver.
Amazônias mil, íntegras e dignas contra os belos destruidores, belos negadores, belos agressores, belos cínicos, belos desastres, belos assassinos, pra sairmos dessa bela merda em que nos meteram.”
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Confira a música “Demarcação Já!”, uma homenagem de mais de 25 artistas aos povos indígenas do Brasil. Pelo direito à terra, pelo direito à vida! #DemarcaçãoJá
Letra: Carlos Rennó
Música: Chico César
Direção: André Vilela D’Elia
Produção: Cinedelia
Artistas:
Ney Matogrosso
Maria Bethânia
Gilberto Gil
Djuena Tikuna
Zeca Pagodinho
Zeca Baleiro
Arnaldo Antunes
Nando Reis
Lenine
Elza Soares
Lirinha – José Paes de Lira
Leticia Sabatella
Zé Celso
Tetê Espíndola
Edgard Scandurra
Zélia Duncan
Jaques Morelenbaum
Dona Onete
Felipe Cordeiro
Criolo
Marlui Miranda
BaianaSystem
Margareth Menezes
Céu
Com participação de:
Eduardo Viveiros de Castro
André Vallias
Ailton Krenak
Já que depois de mais de cinco séculos
E de ene ciclos de etnogenocídio,
O índio vive, em meio a mil flagelos,
Já tendo sido morto e renascido,
Tal como o povo cadiveu e o panará –
Demarcação já!
Já que diversos povos vêm sendo atacados,
Sem vir a ver a terra demarcada,
A começar pela primeira no Brasil
Que o branco invadiu já na chegada:
A do tupinambá –
Demarcação já!
Já que tal qual as obras da Transamazônica,
Quando os milicos os chamavam de silvícolas,
Hoje um projeto de outras obras faraônicas,
Correndo junto da expansão agrícola,
Induz a um indicídio, vide o povo kaiowá,
Demarcação já!
Já que tem bem mais latifúndio em desmesura
Que terra indígena pelo país afora;
E já que o latifúndio é só monocultura,
Mas a TI é polifauna e pluriflora,
Ah!, Demarcação já!
E um tratoriza, motosserra, transgeniza,
E o outro endeusa e diviniza a natureza:
O índio a ama por sagrada que ela é,
E o ruralista, pela grana que ela dá;
Bah! Demarcação já!
Já que por retrospecto só o autóctone
Mantém compacta e muito intacta,
E não impacta e não infecta,
E se conecta e tem um pacto com a mata
–Sem a qual a água acabará –,
Demarcação já!
Pra que não deixem nem terras indígenas
Nem unidades de conservação
Abertas como chagas cancerígenas
Pelas feridas da mineração
E de hidrelétricas no ventre da Amazônia, em Rondônia, no Pará…
Demarcação já!
Já que tal qual o negro e o homossexual,
O índio é “tudo que não presta”, como quer
Quem quer tomar-lhe tudo que lhe resta,
Seu território, herança do ancestral,
E já que o que ele quer é o que é dele já,
Demarcação, tá?
Pro índio ter a aplicação do Estatuto
Que linde o seu rincão qual um reduto,
E blinde-o contra o branco mau e bruto
Que lhe roubou aquilo que era seu,
Tal como aconteceu, do pampa ao Amapá,
Demarcação lá!
Já que é assim que certos brancos agem,
Chamando-os de selvagens, se reagem,
E de não índios, se nem fingem reação
À violência e à violação
De seus direitos, de Humaitá ao Jaraguá,
Demarcação já!
Pois índio pode ter Ipad, freezer,
TV, caminhonete, voadeira,
Que nem por isso deixa de ser índio
Nem de querer e ter na sua aldeia
Cuia, canoa, cocar, arco, maracá.
Demarcação já!
Pra que o indígena não seja um indigente,
Um alcoólatra, um escravo, um exilado,
Ou acampado à beira duma estrada,
Ou confinado e no final um suicida,
Já velho ou jovem ou – pior – piá,
Demarcação já!
Por nós não vermos como natural
A sua morte sociocultural;
Em outros termos, por nos condoermos –
E termos como belo e absoluto
Seu contributo do tupi ao tucupi, do guarani ao guaraná.
Demarcação já!
Pois guaranis e makuxis e pataxós
Estão em nós, e somos nós, pois índio é nós;
É quem dentro de nós a gente traz, aliás,
De kaiapós e kaiowás somos xarás,
Xará. Demarcação já!
Pra não perdermos com quem aprender
A comover-nos ao olhar e ver
As árvores, os pássaros e rios,
A chuva, a rocha, a noite, o sol, a arara
E a flor de maracujá,
Demarcação já!
Pelo respeito e pelo direito
À diferença e à diversidade
De cada etnia, cada minoria,
De cada espécie da comunidade
De seres vivos que na Terra ainda há,
Demarcação já!
Por um mundo melhor ou, pelo menos,
Algum mundo por vir; por um futuro
Melhor ou, oxalá, algum futuro;
Por eles e por nós, por todo mundo,
Que nessa barca junto todo mundo tá,
Demarcação já!
Já que depois que o enxame de Ibirapueras
E de Maracanãs de mata for pro chão,
Os yanomami morrerão deveras,
Mas seus xamãs seu povo vingarão,
E sobre a humanidade o céu cairá,
Demarcação já!
Já que por isso o plano do krenak encerra
Cantar, dançar, pra suspender o céu;
E indígena sem terra é todos sem a Terra,
É toda a civilização ao léu
E ao deus-dará,
Demarcação já!
Sem mais embromação na mesa do Palácio,
Nem mais embaço na gaveta da Justiça,
Nem mais demora nem delonga no processo,
Nem mais parola nem pendenga no Congresso,
Nem lengalenga, nenhenhém nem blablablá!
Demarcação já!
Pra que nas terras finalmente demarcadas,
Ou autodemarcadas pelos índios,
Nem madeireiros, garimpeiros, fazendeiros,
Mandantes nem capangas nem jagunços,
Milícias nem polícias os afrontem.
Vrá! Demarcação ontem!
Demarcação já!
E deixa o índio, deixa os índios lá!
Publicado em: 27/04/17
De autoria: casadevidro247
“#GREVEGERAL – PÁRA TUDO. PÁRA O BRASIL. PÁRA E NÃO VOLTA MAIS. DIA 28/ABRIL, PÁRA TUDO.”
> https://gustavohorta.wordpress.com/2017/04/27/grevegeral-para-tudo-para-o-brasil-para-e-nao-volta-mais-dia-28abril-para-tudo/
“Você pode ficar quietinho e resignado.
Você pode me bloquear se estou enchendo a sua paciência.
VOCÊ PODE LUTAR E PODE, AO MENOS, MULTIPLICAR.
VOCÊ SÓ NÃO DEVERIA NÃO FAZER NADA!!!
#GREVEGERAL
PÁRA TUDO. PÁRA O BRASIL.
PÁRA E NÃO VOLTA MAIS.
DIA 28/ABRIL, PÁRA TUDO, PÁRA TODO MUNDO.”
A Casa de Vidro Ponto de Cultura e Centro de Mídia
gustavo_horta
Comentou em 27/04/17