Redigidos entre 2002 e 2017, os 15 contos que compõem este livro nasceram de diferentes vivências de confinamento físicas e psíquicas.
Colhidos nos seus encontros com a desilusão, a desigualdade, a vida danificada, os personagens se deixam levar por uma inércia sob medida. Contentam-se com o mínimo. Alguns nem mesmo chegam a conceber projetos de fuga, entretendo-se com hábitos maquínicos, parecidos com as rotinas de um algoritmo. Há o amor lírico de uma secretária por seu patrão e do homossexual que se rejeita. Há suicidas em potencial, estiolados na prisão familiar. Há a religião traída. Há a dependência química como fuga, em um bairro que se gentrifica. Há ainda os verdes vidros da gaiola, ou os muros do quintal, como os limites máximos do mundo conhecido. Também habitam neste livro desejos de sucesso difíceis de se realizarem, antes que se chegue à última morada – ou última gaiola – na qual o Sr. José, enterrado vivo, procura imaginar como sua morte afetou a família e amigos.
O livro encerra-se com a descoberta do direito à existência singular, ainda que bizarra, na epifania despretensiosa de quem levanta-se para esticar as pernas após um confinamento dilacerante e prolongado…
ASSISTA AO EVENTO DE LANÇAMENTO (2h4min) – Com a participação de Marcus Vinícius Beck, Marcelo Dakí, Elisabeth Braga e José Marcelo Siviero.
“Talvez eu só esperasse a minha vez, certo de que botecos ruins não estavam naquele plano diretor de remodelação do entorno da Estação da Luz, o Nova Luz. Em breve, seria minha a vez de entregar-me ao copo. Tudo estava feio, tenso. A Rainha andava em círculos, buscando segurar seu quadrado de chão nesses tempos bicudos, bicudos até para os pombos, seus companheiros nas migalhas de rosquinhas servidas nas palmas das mãos (preferiam rosquinhas Mabel, cada vez mais difíceis de se encontrar) […]. Olhos cobiçosos voltavam-se para nós, que só queríamos a indiferença dos engenheiros treinados, dos políticos escoltados, dos fiscais enfezados e dos policiais desocupados. “
(Conto “A rainha dos Campos Elíseos”)
“O ato de Alício não tinha sido pessoal. E, como ele, aquelas mulheres não tinham direito a serem pessoas. Todas elas estavam correndo risco permanente de perder tudo o que fazia sentido, fosse gente ou coisa, e esse medo as fazia sonhar com um homem protetor, que as reconhecesse em meio à massa cega; filhos que criassem com amor e em segurança, a salvo do ódio contra aqueles filhos sem mãe das gaiolas coletivas…”
(Conto: “O reconhecimento”)
Natural de Bauru/SP, Gisele Toassa realizou sua formação na USP, UNESP e York University. É professora de psicologia da Universidade Federal de Goiás, concentrando suas pesquisas em história e teoria da psicologia, psicologia escolar/educacional e psicologia da arte. “Gaiolas sob medida” é seu primeiro livro literário. Em 2011, publicou o livro “Emoções e Vivências em Vigotski” pela Editora Papirus.
Publicado em: 24/06/21
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
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