UMA ARTE DO PRESENTE
por Consuelo Lins
“O senhor solte em minha frente uma idéia ligeira, e eu rastreio essa por fundo de todos os matos, amém!” (Guimarães Rosa, 1998, p. 8) Esta poderia ser a divisa do cineasta Eduardo Coutinho, diante de quem temos a nítida sensação de presenciar o “pensamento em ato”, tal a vitalidade com que se expressa, discute, conversa, filma. Se há uma base comum a seus filmes, às entrevistas que faz, a sua presença, é justamente esse “pensamento ao vivo” em contato com o mundo, que recusa idéias prontas, imagens feitas, mesmo – e especialmente – se forem dele próprio. Desde meados dos anos 1970, as imagens que vem produzindo no campo do cinema documentário nos capturam e impõem uma outra maneira de ver e pensar o Brasil, distante da que nos habituaram os programas de informação televisivos, que, no entanto, trabalham com um material semelhante ao dele: acontecimentos e personagens do mundo.
Curiosamente, é na televisão, no programa Globo Repórter (1975/84), que Coutinho, até então um cineasta ligado à ficção (ABC Do Amor, de 1966, O Homem Que Comprou O Mundo, de 1968, Faustão, de 1970), se torna documentarista. Uma experiência extremamente fértil que marcará profundamente seus filmes posteriores. A agilidade de filmar, a possibilidade de experimentar e errar, a diversidade das situações atraem Coutinho, definitivamente, para a realização de documentários. Ali, ele realiza Theodorico, imperador do sertão (1978), quando coloca em prática, pela primeira vez de forma plena, uma atitude que está na base de seus filmes posteriores: escutar e “entender as razões do outro sem lhe dar necessariamente razão” (Coutinho, 2000, p. 66). Tanto no caso de Teodorico Bezerra, personagem da elite rural brasileira, criticável sob inúmeros aspectos, quanto no dos anônimos de seus outros filmes, a abordagem de Coutinho impede seja a cumplicidade moral com quem está diante da câmera, seja o desrespeito ao pensamento de quem é escolhido para personagem. Coutinho não julga; cabe ao espectador tirar suas conclusões a partir do que vê e escuta. Não se trata de neutralidade nem rejeição do ponto de vista do autor, mas de uma relação original entre o seu ponto de vista e o de seus personagens.
Os filmes de Eduardo Coutinho constituem uma das trajetórias cinematográficas mais importantes do cinema brasileiro contemporâneo. (…) É, desde sempre, um cinema da palavra filmada, que aposta nas possibilidades de narração dos seus próprios personagens. É a imagem da palavra do outro que está na base da sua concepção de cinema. (…) Coutinho faz parte dos documentaristas que, em lugar de se ocuparem de grandes acontecimentos e de grandes homens da história, ou de acontecimentos e homens exemplares, identifica acontecimentos quaisquer e homens insignificantes, aqueles que foram esquecidos e recusados pela história oficial e pela mídia. É a “vida dos homens infames” que interessa a esse cineasta, para retomar o título de um belo artigo de Michel Foucault (1982), no qual a infâmia em questão não diz respeito àquele que é “baixo e vil”, mas aquele que é não-famoso, segundo a etimologia latina da palavra: in = elemento negativo; fama = célebre.
A abordagem que ele faz da vida infame se inscreve, numa certa medida, na tradição do cinema-verdade francês, que tem como filme-manifesto Chronique d’un Été (Crônica de um Verão), dirigido por Jean Rouch e Edgar Morin no verão parisiense de 1960. Uma tradição que afirma a intervenção explícita na realização de um documentário porque sabe que qualquer realidade sofre uma alteração a partir do momento em que uma câmera se coloca diante dela e que o esforço de filmá-la tal qual é inteiramente em vão. (…) Os personagens de Coutinho passam por metamorfoses, contam histórias que não sabiam que sabiam, e saem diferentes dessa experiência. São obras enriquecedoras não apenas para os espectadores mas também para quem participa do filme.
Consuelo Lins
[vimeo=https://vimeo.com/17336031]
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ASSISTA AOS FILMES:
O Homem Que Comprou O Mundo (1968)
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Faustão (1970)
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Seis dias em Ouricuri (1976)
[youtube id=https://youtu.be/vS3UK4xw_Ow]
Teodorico, Imperador do Sertão (1978) [MakingOff]
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Cabra Marcado para Morrer (1984)
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“Coutinho acompanhou as caravanas da UNE Volante pelos sertões do Nordeste brasileiro e conheceu Elizabeth Teixeira, viúva de João Pedro Teixeira — líder de trabalhadores rurais assassinado no município de Sapé, Pernambuco, em 1962, devido às mobilizações e reivindicações em prol da reforma agrária por conta das Ligas Camponesas de Francisco Julião.
O acontecimento atraiu o interesse de Coutinho, ao qual planejou um filme estruturado como ficção de fundo histórico. As filmagens de Cabra marcado para morrer foram interrompidas pelo golpe de Estado de 1964 e consequente implantação da ditadura militar de 21 anos no Brasil. Os atores eram personagens reais que, de uma forma ou outra, vivenciarem os eventos. Dentre eles estava Elizabeth Teixeira — visada por policias e proprietários fundiários. Ela e a família tomaram a decisão de desaparecer, por segurança, após o golpe. Cada membro do grupo tomou paradeiro diferente e incerto. O material filmado foi dado como perdido após a prisão do diretor e membros da equipe por suspeita de subversão.
Em 1981, passados 17 anos, o país respirava os ares da abertura política sob o mandato do General João Batista Figueiredo. Uma boa notícia animou Eduardo Coutinho. As imagens de Cabra marcado para morrer apareceram. Foram escondidas por um membro da equipe. O projeto, retomado, foi amplamente modificado. A realização passou a reconstituir, em forma de documentário, os eventos que lhe deram origem, e assumiu o compromisso de localizar os envolvidos nas filmagens — nunca mais vistos desde que foram abruptamente encerradas. O novo Cabra marcado para morrer conseguiu, após muita pesquisa, reencontrar Elizabeth Teixeira e filhos. Graças ao filme a família foi reunida. A realização atualiza a história das lutas dos trabalhadores rurais no Brasil, defende a necessidade imperiosa da reforma agrária, denuncia a concentração fundiária fortemente ampliada durante o regime militar e a constante insegurança em que viviam e ainda vivem as lideranças sindicais no campo. Concluído em 1984, chegou ao circuito exibidor também nesse ano.” – CineEugenio
Santa Marta – Duas semanas no morro (1987)
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O fio da memória (1991)
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Boca de Lixo (1992)
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Santo Forte (1999)
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Babilônia (2000)
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Edifício Master (2002)
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Peões (2005)
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O Fim e o Princípio (2005)
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Jogo de Cena (2007)
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Moscou (2009)
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Um Dia Na Vida (2010)
MakingOff
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As canções (2011)
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Últimas Conversas (2015)
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EXTRAS
Jogo de Idéias (2006)
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Entrevista
[vimeo=https://vimeo.com/22535062]
Sobre “Grande Sertão: Veredas” de Guimarães Rosa
[youtube id=https://youtu.be/BSOQ7wAdSF8]
LEITURA RECOMENDADA:
O documentário de Eduardo Coutinho – Televisão, cinema e vídeo de Consuelo Lins (Zahar, 2004, Saiba mais / Comprar)
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Publicado em: 28/02/16
De autoria: casadevidro247
Senhores,bom dia
Venho informar que meu e-mail mudou. Agora é: lopesalice555@yahoo.com.br
Estou enviando o comunicado por aqui, porque não descobri como alterar o e-mail.
Obrigada
Alice Lopes
Republicou isso em Blog do Carranoe comentado:
Para quem gosta de Documentário e reconhece a importância de Eduardo Coutinho para o cinema.
Fazia tempo que estava atrás de assistir “Últimas Conversas”. Só aqui consegui. Filme perfeito. Imagem Perfeita. Trabalho de Excelência esse, desse site. Só tenho a agradecer, graças a essa página tive acesso a esse conteúdo maravilhoso. Muito obrigado mesmo. Vocês não tem noção do quanto procurei por esse conteúdo. Fazia tanto tempo que nem acreditei que fosse verdade. Mas foi, estava ali a um clique de distância. Valeu, muito!!!!
Olá, Bento! É realmente excelente esta obra-prima de despedida de Edu Coutinho. O torrent nos foi disponibilizado pelo fórum da MakingOff e aqui compartilhado com vocês. A Casa de Vidro fica feliz de saber que o conteúdo está sendo apreciado! Volte sempre!
Equipe da “acasadevidro” Obrigada pelos links!!!!
Estava dificil achar o torrent de ” As ultimas conversas”
Vocês são demais 😉
Gostaria de assistir O fio da memória e não consigo encontrar em lugar nenhum. Alguém pode me ajudar?
Gostaria de encontrar esses documentários brasileiros.Seria uma forma de divulgar nossos cineastas.Onde conseguir?
Obrigada por compartilhar. Os filmes de Eduardo Coutinho são um patrimônio da história do cinema brasileiro.
A Casa de Vidro Ponto de Cultura e Centro de Mídia
alicepahllopes@ig.com.br
Comentou em 28/02/16