Gigante no palco da História, o presidente brasileiro ergueu sua voz para denunciar o genocídio em Gaza com “coragem e firmeza”, na avaliação do professor da UnB, Luis Felipe Miguel: “Erguer-se contra o holocausto do povo palestino é um imperativo moral”, escreveu o cientista político em seu Intagram, destacando ainda que Lula escolheu o caminho mais difícil ao abraçar este imperativo ético quando “seria mais fácil e conveniente ficar calado, desconversar ou usar eufemismos.” (1)
Apoiado por outros líderes latino-americanos, como os presidentes da Colômbia (Gustavo Petro), de Cuba (Díaz-Canel) e da Bolívia (Luis Arce), o discurso de Lula também já suscitou mais de 60.000 de assinaturas da petição Lula Tem Razão. Logo após a fala pública de Lula na Etiópia, viram-se manifestações de solidariedade em várias partes do mundo – como em Nova York, com uma projeção realizada sobre um arranha-céu dizendo que o mundo precisa é de mais Lulas.
Ao criticar abertamente vários países do “mundo rico”, liderados pelos EUA, por terem cancelado o repasse de recursos para a ajuda humanitária realizada pela entidade da ONU em território palestino (a UNRWA), Lula também acertou em cheio, apontando para a falta de consciência política e de “coração” (num sentido ético e vinculado ao valor da empatia) daqueles que assim se fazem cúmplices do morticínio em curso cometido pelo fascismo sionista liderado por Netanyahu (do partido de extrema-direita Likud).
É também significativo que Lula tenha se manifestado sobre o tema em discurso na 37ª Cúpula da União Africana, na Etiópia, em uma viagem que tem por intento a reconstrução dos laços e pontes entre Brasil e o continente africano. Tal fala também é coerente com a postura recente do governo Lula de apoiar o time jurídico da África do Sul em seu processo contra o estado de Israel na C.I.J. (Corte Internacional de Justiça) em Haia/Den Haag (Holanda).
São índices importantes de uma postura afro-fílica do Brasil sob Lula 3, em radical contraste com a afrofobia e o racismo despudorado da administração anterior de Jair Genocida Bolsonaro – o líder da seita de extrema-direita ainda prossegue impune tanto pelos 700.000 óbitos acarretados por seu terraplanismo sanitário em período pandêmico, quanto pelo fracassado coup d’état que orquestrou e que naufragou no 8 de Janeiro de 2023.
Se o governo bolsonarista via no estado sionista de Israel um de seus mais próximos aliados, e instigava por aqui o bizarro fenômeno das massas de evangélicos neopentecostais pró-sionistas, o governo lulista vai em direção completamente diferente e faz coro com os sul-africanos para exigir o fim do apartheid e da postura de supremacismo militarista colonizador que marca há mais de 75 anos a conduta dos manda-chuvas em Tel Aviv.
Vale ressaltar que Lula denunciou sobretudo que não se trata de uma “guerra entre soldados, mas de uma guerra entre um exército altamente preparado contra mulheres e crianças” (2). A essência do argumento do Lulão está na desproporção entre o número de óbitos de militares, ou seja, de homens adultos envolvidos diretamente no conflito armado: de fato, Israel contabiliza, entre 8 de Outubro e 20 de Fevereiro, em sua ofensiva militar contra Gaza, menos de 300 óbitos em suas forças armadas, enquanto já causou quase 30.000 óbitos, a maioria deles entre a população civil (3). Os dados foram compilados por <Brigadas da Verdade e da Paz> com informações do Ministério da Saúde da Autoridade Palestina, da Red Crescent e do Israeli Medical Services, e se referem à situação em 19/02/2024.
A maior parte dos óbitos de israelenses teria ocorrido no dia 7 de Outubro de 2023, quando alegadamente 1.139 cidadãos de Israel perderam a vida. Na ocasião, o Hamas e outros grupos jihadistas palestinos lançaram a Operação Dilúvio de al-Aqsa – que, apesar de descrita de maneira enjoativamente reiterada como ato terrorista, também poderia ser enxergada como episódio insurrecional da Guerra de Libertação Nacional palestina, baseada no valor da auto-determinação dos povos, historicamente reconhecido por todos as principais entidades do Direito Internacional, e que o Estado de Israel permanentemente nega e viola.
Vale ressaltar ainda que, dentre os 1.139 óbitos, certamente algumas dezenas destes foi causada pelo próprio exército israelense, baseado na Doutrina Aníbal (que apregoa que é melhor matar alguém que está sendo levado refém ao invés de permitir ao inimigo que o conduza ao cativeiro), inclusive com provas audiovisuais de que helicópteros da IDF abriram fogo sobre a rave Supernova em 7 de Outubro quando os combatentes das brigadas Al Qassam agiam para sequestrar pessoas com o intuito de depois “libertá-las” caso o estado sionista topasse também libertar de seus cárceres alguns milhares de cidadãos palestinos presos de maneira ilegal e sem o devido processo jurídico.
Desde 8 de Outubro, Israel teria perdido 232 vidas no assim chamado “conflito” que deixou 30.000 palestinos mortos e milhares de outros ainda desaparecidos, presumivelmente mortos debaixo dos escombros. Nessa guerra de informações, os especialistas em espionagem e desinformação não são os palestinos, vide os casos de ingerência dos israelenses nos assuntos internos brasileiros através da venda de software espião First Mile e Pegasus à família Bolsonaro para vigiar e localizar opositores em tempo real.
De fato não há como chamar de “auto-defesa” um procedimento massacrante em que mais de 18.000 menores de idade e mulheres desarmadas são mortas por bombardeios aéreos realizados em áreas civis densamente povoadas.
Por isso o senador Omar Aziz acertou, apesar de chamar o Hamas de terrorista de maneira simplista, ao pedir ao Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (que pediu a retratação do Presidente Lula), que tipificasse “o que está acontecendo lá, com a morte de 10 mil crianças e mulheres (sic)”. E acrescentou: “não confunda o povo judeu com esse governo de direita, sionista de Israel”. Aziz, filho de palestinos, vai além e diz que revelará quem está por trás da Al-Qaeda, do Hamas, e acrescentaríamos, do Estado Islâmico – que ataca toda a região, veja só, islâmica -, “para estar acontecendo o que está acontecendo”. Segredo de polichinelo, ou surpresa para ninguém, se ele acusasse os Estado Unidos e sua cabeça-de-ponte na Ásia Ocidental, “Israel”.
O Brasil não é o único país e Lula não é o único líder global a sofrer bloqueio midiático e pressão política por parte do sionismo. Para se ter uma ideia do nível de repressão europeia – alinhada ao imperialismo anglo-estadunidense – à qualquer manifestação crítica a “Israel”, na Alemanha 35% das pessoas detidas em protestos pró-palestina são judias. O Partido Trabalhista inglês expulsou de suas fileiras uma anciã judia, sobrevivente do Holocausto nazista, por defender a criação do Estado palestino.
Porém, a resistência internacional de judeus anti-sionista se faz ouvir alto, a exemplo do grupo Judeus pela Torah, que afirmam em suas redes sociais que, em resposta ao ataque de Netanyahu a Lula, afirmou que o “governante israelense” é “pior que Hitler” e veiculou em sua conta do X o seguinde GIF:
Para quem ainda duvide da natureza genocidária da “operação militar de ‘israel'” em Gaza e em todo a Ásia Ocidental, abaixo está reproduzida matéria do portal G1, publicada em 2008, reportando declaração do próprio “governo de israel” em que a entidade sionista promete uma “shoah”, nome hebraico – aliás, uma língua morta, enxertada e ressuscitada pelo sionismo europeu com o único propósito de promover o delírio passadista-religioso, o colonialismo e o genocídio – para holocausto.
A fala corajosa de Lula repercutiu por toda a aldeia global e a polêmica que despertou foi positiva para chaqualhar quaisquer resquícios de indiferença ou apatia naqueles que observam calados enquanto Rafah é transformada de cidade em campo-de-concentração onde mais de 1 milhão de palestinos forçosamente deslocados estão famintos, sedentos, tiritando de frio, desamparados de tudo e temendo a continuidade da carnificina que os vitima há 4 meses.
Retrucando contra Lula, o sionista-fascista Netanyahu usou de sua cartada tradicional e acusou Lula de ser um “virulento anti-semita” e de ter “desrespeitado a memória de 6 milhões de judeus mortos pelo nazi-fascismo”, concluindo que o presidente brasileiro deveria sentir vergonha de si mesmo. Netanyahu é mesmo um caso bizarro de cegueira dogmática e arrogância moral: principal responsável por 30.000 mortes, a maioria delas de civis desarmados, para além da destruição de toda a infraestrutura civil de Gaza, o líder da extrema-direita sionista se sente no direito de ensinar moralidade e de pregar que Lula sinta-se envergonhado pelo que disse.
Netanyahu não demonstra um pingo de vergonha por ter ordenado bombardeios que mataram mais de 10.000 crianças, mas em sua prepotência infinita aponta um dedo acusador contra o presidente brasileiro por ter ousado um paralelo ou analogia entre duas ideologias que desumanizam o outro para justificar sua subjugação e extermínio: o sionismo e o nazifascismo, a despeito de suas diferenças, possuem sim várias semelhanças, e é uma ironia amarga da história que muitas vezes os oprimidos de uma época e de um contexto geopolítico se tornem os opressores de outra época e outro território. Para qualquer palestino em Gaza, hoje Israel aparece claramente como poder opressor, imperial, crudelíssimo em sua imposição da morte em massa, que impõe uma 2a Nakba.
Michelle Weinroth, em Mondolweiss, argumentou: “A comparação do gueto judeu sob o nazismo com o gueto de Gaza sob a atual autoridade fascista de Israel deve deixar de ser um sacrilégio. Na verdade, é essencial que a comparação, por mais desconfortável que seja, seja expressa abertamente, nem que seja apenas para forçar Israel e os seus apologistas a verem o reflexo do Estado ‘judeu’ no espelho do passado nazi e, esperançosamente, a ponderarem com repulsa a sua própria realidade fascista. Se isso pudesse acontecer, marcaria um ponto de viragem significativo na história.”
por Eduardo Carli e Renato Costa para A Casa de Vidro
22/02/2024
REFERÊNCIAS
BRIGADAS DA VERDADE E DA PAZ. Boletim Diário do Genocídio na Palestina – 19-02-2024. Instagram.
LULA DA SILVA, Luis Inácio. Discurso na 37ª Cúpula da União Africana, Etiópia, 2024.
MIGUEL, Luis Felipe. Não Existe Genocídio do Bem. Instagram, 2024.
WEINROTH, Michelle. Why we have to make the Jewish Ghetto comparison. Mondoweiss, 2024.
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Publicado em: 22/02/24
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
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