“Limpeza étnica não é auto-defesa!”
O governo sionista de Israel, com pleno apoio dos EUA, entrou em modo genocídio-prático nas últimas duas semanas, alegando estar agindo em “auto-defesa” contra as atrocidades cometidas pelo Hamas em 7 de Outubro. Netanyahu e Biden dão as mãos – ambas sujas de sangue – para celebrar um direito de “auto-defesa” que consiste de fato numa punição coletiva desferida contra um território onde moram mais de 2 milhões e 200 mil pessoas, mais de metade destes habitantes sendo crianças e adolescentes.
Os palestinos de Gaza encontram-se bombardeados por todos os lados, sem acesso a água potável, com eletricidade cortada, numa das crises humanitárias mais graves da história do século 21. Não é surpresa para ninguém que, na contabilidade macabra das mortes, o lado palestino já tenha quase o triplo de cadáveres do que o lado israelense neste Outubro do descalabro e da insensatez. Segundo a Al Jazeera, em 19 de Outubro mais de 3.300 palestinos já foram mortos pelas agressões militares de Israel, enquanto cerca de 1300 israelenses morreram nos ataques do Hamas em 7/10.
A ofensiva contra o enclave de Gaza já causou a morte de mais de 800 crianças enquanto apenas 8 líderes da “organização terrorista” que Israel financiou e ajudou a criar foram “abatidos” (é o que conta a <reportagem de Seraj Assi para a Jacobin>). E “abatidos” palavra adequada aqui, pois os poderes militares israelenses não cessam de bestializar o inimigo e chamá-los de animais. A “animalização” dos militantes do Hamas, no discurso sionista, intenta justificar assim o seu “abate”, não importando quantos “danos colaterais” ocorram em termos de vítimas civis, hospitais e escolas destruídos, famílias inteiras sacrificadas – inclusive nas áreas para as quais um massivo deslocamento forçado foi ordenado pelos sionistas supostamente em prol da “segurança” dos deslocados.
Após o 7 de Outubro, “Israel ordenou que mais de um milhão de palestinos no norte de Gaza evacuassem imediatamente suas casas. Atendendo ao aviso, setenta palestinos embarcaram em um comboio em fuga rumo ao sul de Gaza. Minutos depois, um ataque aéreo israelense atingiu a caravana civil com uma precisão assustadora, matando todos a bordo.” (ASSI, Seraj. In: Jacobin)
Neste Outubro de Carnificina, é recomendável convocar um senso de historicidade para compreender todo este confuso derramamento de sangue: o imperialismo sionista de Israel está querendo construir o 7 de Outubro como a sua própria versão do 11 de Setembro de 2001, como se houvesse uma analogia entre os ataques da Al-Qaeda aos EUA e aqueles do Hamas contra Israel no mês corrente. Ambos seriam marcos na história do terrorismo praticado pela jihad islâmica e justificariam guerras de “auto-defesa”.
Quando os EUA, na sua “Guerra Contra o Terror”, invadiu o Iraque em 2003, mesmo que todos soubéssemos que não havia vínculo do regime iraquiano com o 11 de Setembro promovido por extremistas afegãos que foram ex-aliados dos EUA, o morticínio gigantesco que se seguiu foi “auto-defesa” ou foi agressão imperial sedenta por petróleo?
A analogia 11 de Setembro de 2001 e 7 de Outubro de 2023 existe em um sentido bem diferente do que os poderes imperiais desejam admitir: tanto a Al-Qaeda quanto o Hamas são os filhotes-problema dos EUA e de Israel. Um nasceu financiado pelos EUA na sua luta contra a URSS no Afeganistão no âmbito do anti-comunismo fanático da yankosfera na Guerra Fria, o outro nasceu financiado e apoiado por Israel em sua luta contra o partido palestino secular que era liderado por Yasser Arafat.
The Intercept: How Israel Helped Create Hamas [https://www.youtube.com/watch?v=o7grSsuFSS0]
Na ONU, o Conselho de Segurança, atualmente presidido pelo Brasil, tentou votar uma resolução para interromper os massacres atualmente promovidos por Israel em Gaza e tentar produzir cessar-fogo, ajuda humanitária e libertação dos reféns que o Hamas retém; 12 países aceitaram o documento proposto pelo Brasil, 2 países se abstiveram e apenas os EUA se manifestou contra – derrubando toda a iniciativa com o seu poder de veto.
Leia mais aqui: US vetoes UN resolution calling for humanitarian pause in Israel-Hamas war [https://www.aljazeera.com/…/us-vetoes-un-resolution…]
Desta forma, os EUA assume sua postura pró-sionista e dá todo o apoio ao genocídio em curso. Francesca Albanese, responsável por reportar à ONU a situação nos territórios palestinos ocupados e atualmente massacrados, alertou em fala à Amy Goodman em entrevista ao Democracy Now!: “the displacement of potentially millions of Palestinians from Gaza would constitute the ‘largest instance of ethnic cleansing in the history of this tormented land.”
Veja aqui: [https://www.democracynow.org/…/un_special_rapporteur…]
Em <17 de Outubro, o hospital batista Al-Ahli, em Gaza, foi bombardeado com mais de 500 vítimas fatais>. Como a covardia não tem limites, Netanyahu veio a público para culpar a Jihad Islâmica Palestina por ter destruído o hospital ao errar o alvo de um foguete destinado a Israel; a organização palestina nega a acusação (https://revistaforum.com.br/…/jihad-islmica-nega-ataque…).
Já ouvimos muitas vezes que “uma das primeiras mortes em uma guerra é a da verdade”, mas não deixa de ser chocante: provavelmente estamos diante de uma fake news das mais chocantes já espalhadas pela maquinaria de desinformação do sionismo israelense, que parece capaz não apenas de cometer uma atrocidade contra um hospital mas também de acusar falsamente o inimigo de tê-lo cometido, com o respaldo de Joe Biden que, em Tel Aviv, rodeado pelos comandantes israelenses, reafirmou que a carnificina no hospital “parece ter sido cometida pelo outro time”.
Vale perguntar ao Sr. Netanyahu e ao Sr. Biden se os 111 ataques a hospitais e centros de saúde nos territórios palestinos desferidos por Israel entre 7 e 15 de Outubro, segundo dados da Organização Mundial de Saúde, constituem atos justificáveis de “auto-defesa” e se somente o ataque mais massacrante do hospital de Al-Ahli é que deve ser atribuído à péssima mira dos jihadistas…
Veja aqui: https://www.aljazeera.com/…/where-in-gaza-is-al-ahli…
A Casa de Vidro produziu recentemente um documentário curta-metragem na manifestação massiva que levou pelo menos 10.000 pessoas às ruas de Amsterdam em solidariedade ao povo palestino – acesse o filme e as fotografias e comentários textuais de seu realizador @Eduardo Carli de Moraes (que também assina o que você acabou de ler) em nosso site oficial: https://acasadevidro.com/palestina/.
Há um genocídio em curso que o Conselho de Segurança da ONU não está conseguindo impedir, apesar da “vitória diplomática do Brasil” – que conquistou um quase-consenso na votação de sua resolução. O problema é que os EUA, com seu poder de veto e seu ainda operante imperialismo arrogante decidiu que os crimes de guerra perpetrados pelos sionistas, e que causam indignação e horror em várias partes do mundo que já irrompem em manifestações e insurreições, pode ser descrito como “auto-defesa”. Mais de 800 crianças mortas, em seu terrível silêncio dilacerado, dizem que não – não chamem esta carnificina de bebês e de moleques de “auto-defesa”! E parem de fingir que vocês não tem culpa no cartório pelas décadas de ocupação opressiva e pelos inúmeros episódios de deslocamento forçado dos palestinos. E não tentem apagar de nossas memórias o quanto o extremismo islâmico jihadista, certamente atroz, foi apoiado e financiado por EUA e Israel quando foi interessante na luta contra o comunismo sovético ou contra o secularismo da Fatah.
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Publicado em: 19/10/23
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
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