Nascido em Bolonha, na Itália, no ano de 1988, o artista Lorenzo da Gaitinha lança seu álbum de estréia: “Nossa Música Não Tem Pátria” (2020, 45 min). As 14 canções deste disco digital poliglota e versátil transitam com desenvoltura por várias línguas (o italiano, o português e o inglês) e gêneros musicais (sobretudo o folk, o blues, o samba etc.).
Minimalista em sua instrumentação, mas grandioso em seus sentimentos, neste álbum Lorenzo deixa fluir sua rica expressividade através do violão, da voz e da gaita. O músico é acompanhado, em algumas músicas, pela percussão e voz de André Baleeiro, o Jardineiro Agroecológico.
A produção audiovisual e a captação de som ficaram a cargo de Eduardo Carli de Moraes. Os vídeos contaram com um background charmoso concedido pelo graffitti de Diogo Rustoff. Este é o segundo lançamento da gravadora independente A Casa de Vidro (o selo antes havia lançado o disco de Adriel Vinícius, “Vivo Aqui e Agora” [2019]).
01) Dimmi Bel Giovane (Francesco Bertelli – Versão Rabbi/Baleeiro) – 3:20
02) Pietà L’è Morta (Nuto Revelli) – 3:33
03) I Ain’t Got A Home In This World Anymore (Woody Guthrie)
04) Tu Vuò Fa’ L’Americano (Renato Carosone) – 2:32
05) St. Louis Blues (W. C. Handy) – 3:49
06) Me So’ Mbriacato (Mannarino) – 2:59
07) If I Could (Simon e Garfunkel) – 5:51
08) After You’ve Gone (Turner Layton, Henry Creamer) – 3:00
09) Via del Campo (Fabrizio De André) – 01:56
10) Dança da Solidão (Paulinho da Viola) – 2:12
11) Canto das 3 Raças (Paulo César Pinheiro)
12) Geordie (Tradicional) – 02:30
13) Reckoning Song (Asaf Avidan): 3:11
14) Wayfaring Stranger (Tradicional) – 4:38
Vocês podem fazer o download do álbum digital na íntegra (MP3 de 256 kps) ou, caso prefiram, podem assistir a todos os vídeos
A DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO À CULTURA sempre pautou o trabalho d’A Casa de Vidro, assim como nosso desejo de ser uma caixa de ressonância para as vozes artísticas alternativas e independentes, para que ganhem maior visibilidade e se comuniquem com um público que esteja afim de expandir seus horizontes. Este trabalho de produção cultural, no entanto, tem vários custos (em equipamentos e em trabalho investidos), necessitando crucialmente do apoio de colaboradores que acreditam em nossas práticas e queiram contribuir com esta construção coletiva de uma produção artística inovadora e inédita. Para nos apoiar, escolha uma das opções de colaboração voluntária: doe R$5 – doe R$10 – doe R$50 (ou algum de seus respectivos múltiplos).
Cidadão-do-mundo, Lorenzo Rabbi atua como médico mas nunca se limitou a esse ofício. Pelo contrário, seu amor e curiosidade pela riqueza cultural da humanidade o inspiram a viajar pelo mundo sem muitos planos, mas com uma mochila cheia de instrumentos musicais. Ele pratica uma forma de “turismo engajado”, ficando por meses em comunidades de diversos países e realidades para participar de projetos sociais ou simplesmente vivenciar e contribuir com o que puder.
De passagem por Goiânia, Lorenzo abraçou as causas do ponto de cultura A Casa de Vidro e topou participar de duas tardes de gravação informal, repletas de espontaneidade, compartilhando algumas das pérolas de seu repertório. São interpretações emocionadas de um repertório de músicas que atravessa épocas e territórios. O músico também estabeleceu um bom diálogo com a sinfonia dos bem-ti-vis, joãos-de-barro e maritacas que o acompanharam no nosso Jardim Agroecológico.
A canção de abertura, “Dimmi Bel Giovane”, é uma recriação, com letra em português, de uma composição realizada originalmente sobre um poema de Francesco Bertelli (1871), “Esame Di Ammissione Del Volontario alla Comune di Parigi”.
Logo na sequência, a canção anti-fascista “Pietà L’è Morta”, de Nuto Revelli, já gravada pela banda italiana Modena City Ramblers, ressurge na interpretação voz-violão-e-gaita do músico Lorenzo. Ao final, ele fala um pouco sobre o contexto histórico-político que envolve o nascimento da canção.
Outras canções italianas marcam presença, a exemplo de “Via del Campo” de (Fabrizio de Andrè), de “Me So’ Embriacato” (de Mannarino), e de “Tu Vuò Fa’ L’Americano” (Renato Carosone).
Um dos maiores méritos do álbum é a revitalização das tradições do blues e do folk, com interpretações inspiradas de pérolas do cancioneiro, algumas delas com mais de um século desde que foram compostas: marcam presença clássicos como “St. Louis Blues” (1914, de W. C. Handy) e “After You’ve Gone” (de 1918, de Layton e Cleamer).
Já o mestre do folk Woody Guthrie – uma das influências determinantes para figuras como Bob Dylan, Bruce Springsteen e Beck – é aqui homenageado com uma poderosa interpretação de uma das mais célebres Dust Bowl Ballads: “I Ain’t Got a Home In This World Anymore”.
Canções tradicionais que remontam ao século 19, como “Wayfaring Stranger”, já gravada por Johnny Cash, também estão presentes, assim como baladas que se tornaram célebres nas vozes de Simon & Garfunkel: “If I Could”é uma versão com letra da melodia andina “El Condor Pasa”. Já “Geordie” rememora, com a maestria dos melhores trovadores medievais, uma sentença em que um servo é enforcado em uma corda de ouro por roubar veados do rebanho real.
A música brasileira também é evocada através de duas interpretações minimalistas de “Dança da Solidão” (de Paulinho da Viola) e “Canto das 3 Raças” (de Paulo César Pinheiro, célebre na voz de Clara Nunes). Em um processo de ir “estudando o samba” à la Tom Zé, o violão italiano folk brinca de samba em companhia de amigos. Internacionalista, enraizado, exploratório, o som de Lorenzo é feito para curtir, mas também informa e educa devido à diversidade e beleza do repertório escolhido. Ouça este álbum para relaxar e refletir que Nossa Música não tem pátria!
Publicado em: 08/09/20
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
A Casa de Vidro Ponto de Cultura e Centro de Mídia