A Comissão Nacional da Verdade (CNV), uma das realizações mais relevantes da sociedade civil brasileira, emergindo no primeiro mandato presencial de Dilma Rousseff, visava desocultar verdades que o regime militar havia enterrado, missão louvável mas repleta de obstáculos. E não falo apenas de obstáculos epistêmicos, que impediriam este processo de alethéia, mas obstáculos bastante concretos e que se manifestam nas figuras de milicos em seus tanques, portando seus fuzis.
A Verdade nunca foi de fato um valor para boa parte dos homens que integram as Forças Armadas do Brasil. A mentira interesseira e conveniente sempre foi aceita como instrumento de manobra de massas por estes “manobristas de gente” (para lembrar uma canção de Beto Cupertino do Violins). A CNV tinha uma função magnífica, mas seu impacto social foi tímido, até mesmo pífio: não se conseguiu de fato uma transformação da consciência e da atitude das massas de cidadãos brasileiros para a relevância dos trabalhos da desta Comissão des-ocultadora de verdades inconvenientes aos criminosos dos terroristas-de-Estado daqueles tempos. Não houve significava comoção de indignação coletiva diante dos fatos que a CNV trouxe à tona.
As atrocidades cometidas pela ditadura militar brasileira não puderam ser plenamente reveladas ao nosso povo também pela presença ainda considerável dos milicos de outrora, ou de seus herdeiros, no epicentro da política institucional do país – o próprio Jair Bolsonaro é um detrito tóxico que sobrou daquela época de chumbo. Um ovinho de serpente que a Ditadura nos legou. Jair, Heleno, Villas-Bôas, que posam atualmente de autoridades da república, não passam de anacronismos ambulantes, velhos homens ricos, de mentalidade ultrapassada e carola, que se identificam com a causa da supremacia branca, desejando por aqui a submissão manu militari dos oprimidos – enquanto eles, nos pálacios, lucram sendo os vendilhões da pátria ao capital estrangeiro e massacrando a oposição em porões – para depois enterrar os ossos dos “terroristas” em valas comuns de cemitérios clandestinos.
Como na Ditadura Militar que sadicamente idolatra, o desgoverno neofascista de Bolsonaro está censurando informações sobre a pandemia de covid19 no Brasil, em uma política de Estado que se exacerbou e se explicitou em Junho de 2020. A covid19 é a nova meningite – nos anos 1970, o regime militar tratou também de formular uma mega-operação conspiratória e ideológica para acobertar a extensão da epidemia de meningite – “se a ditadura não tivesse acobertado a crise, ela não teria sido difícil de controlar a partir de 1974. Em 1976, o numero de contágios já eram seis vezes maior ao ano anterior, e uma operação gigante de vacinação se tornou necessária.” (Aventuras na História)
“Bolsonaro se acha capaz de esconder os corpos”, como disse o filósofo Safatle em entrevista a Pública.
“O Estado brasileiro tem todas as condições para lidar com a crise do coronavírus, protegendo a população. Mas o Brasil não tem como enfrentar a pandemia com Jair Bolsonaro na presidência do país”. Para o filósofo Vladimir Safatle, professor livre-docente da Universidade de São Paulo, o presidente “potencializa a crise” ao travar e desarticular as medidas de combate à epidemia e proteção às pessoas, o que deve motivar a maioria da população a se mobilizar “de forma horizontal” pelo impeachment do presidente.
“Uma coisa que poderia nascer dessa experiência de uma luta coletiva contra a pandemia é um afeto político fundamental, de solidariedade genérica: ‘minha vida depende de pessoas que eu nem sei quem são’. Elas não parecem comigo, não fazem parte do meu grupo, e essas pessoas são fundamentais; o que demonstra que nós temos um destino coletivo. Só que a esquerda, de tão presa que ela está em outro tipo de pauta, não consegue vocalizar uma pauta de solidariedade genérica universal”, diz o filósofo que assinou uma proposição de três deputados do PSOL que obteve mais de 1 milhão de assinaturas pelo impeachment do presidente.
AGÊNCIA PÚBLICA DE JORNALISMO
https://apublica.org/2020/04/safatle-bolsonaro-se-acha-capaz-de-esconder-os-corpos/
O Brasil não tem condições de gerir duas crises ao mesmo tempo – e o Bolsonaro é uma crise ambulante. Ele trava todas as medidas, desarticula todas as medidas, mobiliza setores da população para que burlem as medidas que são necessárias para contenções mínimas e ele aproveita essa situação para criar um sistema de destruição de qualquer possibilidade de garantias da classe trabalhadora, da classe mais desfavorecida. Essa MP, a flexibilização de demissões em uma situação como essa, os trabalhadores terem até 70% do seu salário reduzido, isso mostra como ele potencializa a crise, ele multiplica a crise. O Brasil não tem a menor condição de suportar isso por mais tempo.
(…) A minha tendência é acreditar que, bem, o Bolsonaro fez duas apostas, né? A primeira é de que ele é capaz de esconder os corpos. O seu DNA de torturador, de porão da ditadura militar, de amante do Ustra, faz com que ele acredite que ele pode fazer o que normalmente se faz no Brasil que é desaparecer corpos, esconder mortes, fazer com essa pandemia passe mais ou menos incólume, quer dizer, ele acha que é capaz de fazer isso.
VLADIMIR SAFATLE, 2020. Entrevista à Pública
https://apublica.org/2020/04/safatle-bolsonaro-se-acha-capaz-de-esconder-os-corpos/
Em uma conjuntura onde informação é essencial para nortear as ações de contenção da epidemia, Seu Jair aposta no obscurantismo explícito e na desinformação mortífera. É genocídio seguido pela tentativa de ocultar em massa os cadáveres das vítimas de sua irresponsabilidade criminosa. É Jair Bolsonaro cometendo crimes contra a humanidade em série e ainda em plena impunidade. Quem ainda apóia este péssimo governo, esta necropolitica sórdida, esta desumanidade instituída, tem cumplicidade com o serial killer q ocupa ilegitimamente o Palácio do Planalto. E quem lava as mãos o faz numa bacia cheia de sangue. #ForaBolsonaro
LEITURAS SUGERIDAS:
Caso é considerado emblemático dos entraves que uma ditadura impõe ao enfrentamento de crises de saúde pública
AVENTURAS NA HISTÓRIA
Publicado em: 07/06/20
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
A Casa de Vidro Ponto de Cultura e Centro de Mídia